ENTREVISTA: Michele Rufino fala sobre Ensino Remoto Emergencial, ela atua no IF-Sertão Salgueiro

Nesta terça-feira (27), nossa convidada para a entrevista é a Técnica em Assuntos Educacionais e atualmente Assessora de Ensino do Campus Salgueiro do IF-Sertão, Michele Rufino. Ela é Mestre em Educação pela Universidade Federal da Bahia e desde de 2017 atua na formação de professores. O tema da entrevista: Ensino Remoto Emergencial.

Blog - Olá, Michele seja bem-vinda ao blog. Desde de já agradeço por sua disponibilidade em ajudar nossos leitores. Primeiro, explica o que é considerado ensino remoto emergencial?

Michele - Primeiramente quero parabenizá-lo pelo blog que está lindo e muito rico de conteúdo. Com certeza já está sendo sucesso! Depois agradecer pelo espaço, por poder contribuir com seus leitores trazendo o esclarecimento sobre o ensino remoto e como ele tem acontecido na prática e os imensos desafios que o envolve

O Ensino Remoto Emergencial é uma medida adotada pelas instituições de ensino, com autorização do MEC, para o cumprimento do ano/período letivo nesse momento de pandemia em que o isolamento social é a medida mais eficaz para o controle da disseminação do coronavírus - Sars Cov-2.

De modo geral, o que estamos chamando de ensino remoto são as aulas remotas porque a modalidade de ensino continua presencial, a forma como as aulas ocorrem foi que mudou. E o que seriam essas aulas remotas? As aulas remotas são aquelas que ocorrem em local diverso do ambiente escolar sem a presença física do professor e sem a formação de grupos de alunos em um mesmo ambiente físico. Podemos dizer que a aula remota tem proporcionado a rotina da sala de aula com o oferecimento de aulas no mesmo turno do estudante quando das aulas presenciais. De forma geral, as aulas remotas têm sido mediadas pelas tecnologias digitais, com o uso de aplicativos de videoconferência para as aulas síncronas e com disponibilização de mídias diversas e postagem de atividades avaliativas no Ambiente Virtual de Aprendizagem – AVA para as aulas assíncronas.

Nas aulas remotas, o horário de aulas é elaborado, cujas disciplinas são distribuídas na semana com horário definido para suas aulas dentro do turno de origem do estudante quando das aulas presenciais.

Blog - Essa novidade divide opiniões, no entanto, a realidade pandêmica não deixa o ambiente escolar seguro para o retorno presencial. Sobre o ensino remoto quais são os principais desafios?

Michele - Infelizmente vivemos um grande desafio nesse momento em decorrência da Pandemia da Covid-19. Logo no início da pandemia, imaginamos que, em pouco tempo, a situação seria controlada e retomaríamos nossas rotinas, com a volta às aulas. Acontece que nada ocorreu como pensávamos e, hoje, depois de 1 ano e 1 mês não temos perspectiva de retorno presencial com segurança, dada a situação atual.

Esse momento não foi fácil no início e não tem sido fácil agora. O maior desafio é a garantia da aprendizagem dos estudantes nesse período. As escolas públicas são as que mais enfrentam esse drama, pois a maioria de nossos alunos (rede pública, independente da esfera administrativa a que pertença) não dispõe dos recursos mínimos (como computador, internet de qualidade e espaço adequado para estudo) para a participação das aulas remotas. Somado a isso ainda temos os estudantes que precisam trabalhar para ajudar no sustento de sua família.

As escolas têm buscado estratégias para minimizar os danos educacionais desse momento, com a disponibilização de materiais impressos para o estudante sem internet, gravação das aulas para acesso posterior por aqueles que não puderam, por motivos outros, participar das aulas no momento em que ocorreram, maior flexibilização para a realização das atividades, entre outros.

Além disso, um outro grande desafio tem sido a formação docente. Esse momento exigiu do docente não somente os conhecimentos técnico-científicos e didático-pedagógicos, mas também e especialmente o conhecimento tecnológico. Os docentes precisaram, com apoio ou sem apoio, ir em busca desses conhecimentos tecnológicos para continuar o seu trabalho no novo formato de ensino imposto para o momento: Ensino Remoto Emergencial. Muitos docentes acostumados com o quadro branco ou negro mal faziam uso do computador, muitos tiveram que aprender, de maneira muito penosa, a manipular esses equipamentos, além das plataformas digitais adotadas pelas escolas. Somado a isso, tiveram que mudar sua prática pedagógica para se adequar às novas exigências do formato.

Um outro destaque a ser colocado aqui como desafio para o docente foi a falta de apoio financeiro, por parte do governo, para quem trabalha na rede pública de ensino, e por parte das escolas, para quem trabalha na rede privada, de modo que pudessem custear a compra de equipamentos, como computador, contratação de internet mais veloz, aquisição de materiais digitais, pagamento de cursos na área tecnológica para aprimorar sua prática, contratação de serviços que auxiliassem no seu planejamento de aula, etc. Boa parte dos docentes se viram sozinhos e desamparados, infelizmente, neste momento tão delicado.

Esses são apenas alguns exemplos de quão desafiador tem sido esse momento.

Blog - Os docentes estavam preparados para essa realidade ou isso tem mexido com os profissionais da educação? Eles ainda precisam se adequar as novas tecnologias?

Michele - Na verdade, ninguém estava preparado para esse momento, mesmo aqueles que já tinham domínio tecnológico. Esse momento pegou todos de surpresa, razão pela qual muitas instituições de ensino demoraram um pouco mais para iniciar o ensino remoto emergencial.

Essa realidade de ensino remoto emergencial tem exigido muito dos profissionais de educação. O trabalho tem se tornado exaustivo para todos os envolvidos. Os professores estão mais suscetíveis ao adoecimento emocional, em decorrência da sobrecarga de trabalho, o que aponta vários estudos já apresentados na mídia. Há indícios, inclusive, de que pode ocorrer adoecimento em massa dessa categoria. As instituições, mais sensíveis a esse momento, têm disponibilizado profissionais de saúde, como psicólogo para atendimento desses profissionais. Mas, a maioria das instituições não oferece esse atendimento.

Em relação à adequação às novas tecnologias, tudo é um processo e que leva tempo para a apropriação adequada. Além disso, como seres inacabados que somos, vivemos em processo constante de construção e de reconstrução, nesse sentido, sempre estamos aprendendo e sempre precisaremos aprender para aprimorar a nossa prática. Há um universo de recursos tecnológicos disponível que precisa ser descoberto, testado, aplicado e adotado, caso atenda a necessidade do docente e seja de fácil acesso e assimilação por parte do estudante.

Blog - Sobre o ensino no IF Sertão-PE Campus Salgueiro, que permanece na modalidade remota, quais são os métodos utilizados para continuar com a qualidade de ensino e aprendizagem?

Michele - Infelizmente, dada a situação pandêmica, continuamos com o Ensino Remoto Emergencial.

Você não imagina como esse momento tem sido desafiante para nós! Posso dizer que “vencemos um leão por dia” para conseguir dar continuidade ao nosso trabalho com a qualidade que primamos e defendemos.

A decisão pelo ensino remoto não foi fácil. Temos ciência da situação socioeconômica do público que atendemos, em que mais de 90% é baixa renda. Como introduzir o ensino remoto emergencial, mediado pelas tecnologias digitais, garantindo a qualidade no ensino oferecido, se boa parte do nosso público não consegue suprir suas necessidades básicas, como alimentação por exemplo? Assim, a primeira medida tomada, após a decisão das aulas de modo remoto, foi a de garantir que nossos estudantes tivessem condições mínimas para participar das aulas remotas. Nesse sentido, foi oferecido o auxílio alimentação emergencial, o auxílio digital para a aquisição de internet banda larga e a compra de equipamento digital (como tablet ou celular). Os auxílios alimentação e internet são pagos mensalmente. O auxílio equipamento, foi feito o pagamento de 800 reais em uma única vez para a compra do equipamento por parte do estudante. Atualmente, não dispomos mais do auxílio equipamento, mas, através de chamada pública, disponibilizamos tablets aos estudantes em forma de comodato.

Somada a essa medida, oferecemos formações para nossos docentes voltadas para a realidade concreta, ou seja, nossas formações foram pautadas nas necessidades dos nossos docentes para o momento inicial do ensino remoto. Também construímos, coletivamente, um plano de ação para esse momento com orientações diversas para a garantia da permanência e êxito dos nossos estudantes.

Além disso, oferecemos formação para nossos estudantes, de modo que se sentissem mais seguros e amparados para navegar no desconhecido: o ensino remoto emergencial mediado pelas tecnologias digitais.

Todas essas ações visaram, em primeiro momento, a garantia de condições mínimas para participação do ensino remoto emergencial.

Nós dispomos de professores altamente qualificados e sensíveis à situação atual e às dificuldades dos nossos estudantes, em que suas práticas têm como premissa a inclusão dos estudantes.

Contamos com uma equipe técnico-pedagógica composta por Técnicos em Assuntos Educacionais e Pedagogos para fazer todo o acompanhamento dos estudantes de todos os níveis e modalidades de ensino ofertados. Além disso, contamos com Psicóloga e Assistente Social que têm feito o acompanhamento dos estudantes também a partir de demandas (os professores e a equipe técnico-pedagógica ao identificar a necessidade do estudante de ser acompanhado por uma dessas profissionais, faz o encaminhamento).

Em relação às aulas práticas, elas foram adaptadas de modo a não comprometer a qualidade, por isso, a decisão da adaptação foi colegiada, tomando como referência as possibilidades, através de simuladores, aplicativos similares aos utilizados em aula presencial, a realização de práticas em laboratório para demonstração aos estudantes através de vídeos, etc.

Realizadas todas essas ações, estamos nós no terceiro semestre letivo de modo remoto.

Blog - Na sua opinião, quais são os principais prós e contras o ensino remoto e por quê?

Michele - O benefício que percebemos é que, apesar de todas as dificuldades já colocadas aqui, estamos conseguindo dar continuidade ao ensino com a garantia da qualidade, garantia essa confirmada com a aprovação dos nossos estudantes, do Ensino Médio Integrado, no SISU (através da nota do ENEM) para ingresso nos cursos superiores nas Universidades Públicas e Institutos Federais por todo o país. Orgulhamo-nos muito dos nossos estudantes que foram verdadeiros guerreiros em 2020 e agora em 2021 constroem um novo capítulo de suas histórias.

Em relação aos contras, a situação mais triste é a razão pela qual nos encontramos nesse momento de ensino remoto emergencial: pandemia da Covid-19 que tem cessado a vida de milhões de pessoas. Além disso, temos todas as dificuldades já evidenciadas nas falas acima, bem como a falta do contato físico, do abraço, das conversas, do aconchego que tanto nos faz bem. 

Blog - Michele, existe alguma diferença entre o ensino remoto e a Educação à distância oferecida por várias instituições de ensino superior?

Michele - Sim, inúmeras.

É importante deixar claro que o Ensino Remoto Emergencial não é uma modalidade de ensino, mas uma estratégia adotada pelas instituições de ensino de todo o país para dar continuidade ao ensino nesse momento de pandemia em que o isolamento é a medida mais eficaz para o controle da circulação do vírus.

Neste caso, os projetos pedagógicos dos cursos foram elaborados para o ensino presencial, os alunos se matricularam para um curso presencial, mas que, por uma situação emergencial, o MEC autorizou as instituições de ensino ofertarem as aulas de modo remoto, mediadas ou não pelas tecnologias digitais.

Para essa situação, os profissionais docentes precisaram alterar todo o seu planejamento de aula, precisaram se reinventar, precisaram aprender a usar algumas ferramentas digitais de forma aligeirada para o ensino acontecer e o ano letivo ser continuado. Veja que aqui não houve planejamento prévio, com bastante antecedência, para esse tipo de ensino, ele aconteceu de forma inesperada e sem planejamento adequado. Vale mencionar que no ensino remoto há a existência de aulas assíncronas (sem interação em tempo real, em que as aulas ocorrem através do acesso a mídias diversas – textos, vídeo-aulas, podcast, etc. -  independentemente do local e horário) e síncronas (aulas em tempo real, através de aplicativos de webconferências), em que professores e alunos interagem através de voz, vídeo e textos, diferentemente da EAD em que as aulas só ocorrem de forma assíncrona.

Já a Educação a Distância é uma modalidade de ensino que tem regulamentação própria, cujos projetos pedagógicos dos cursos são pensados e elaborados para seu oferecimento a distância, eles são construídos e pensados para essa modalidade, todo o planejamento de ensino se pauta na educação a distância, com o uso de ambiente virtual próprio, que é o que chamamos de Ambiente Virtual de Aprendizagem – AVA. Além disso, há critérios específicos para seu funcionamento, os cursos superiores são avaliados tal qual os cursos presenciais, há profissionais específicos para atuar na educação a distância, como os tutores, por exemplo e os profissionais, para atuar na EAD, precisam de formação específica para esse fim.

Blog - Quero agradecer pela sua participação nessa entrevista e por também ser leitora do blog. Deixa uma mensagem para a comunidade escolar que espera um dia poder voltar a se encontrar.

Michele - Agradecer também pelo espaço por ser um GRANDE PARCEIRO do campus Salgueiro do IF Sertão-PE, aproveito para me colocar a sua disposição para outros momentos. Estamos à disposição sempre que precisar.

Aos nossos queridos alunos quero dizer que aguentem firmes aí que logo, logo voltaremos com as nossas aulas presenciais, mataremos as saudades e conheceremos pessoalmente os que entraram já no momento de aulas remotas.

Aos meus companheiros de luta, agradecer pelo brilhante trabalho desenvolvido, por toda a dedicação, empenho e cuidado com nossos estudantes e dizer que na volta, se Deus permitir, festejaremos o reencontro.

Cuidem-se, usem máscara e saiam de casa somente para o extremamente necessário.

Author
Thiago Lima

Thiago de Lima Silva, natural de Salgueiro-PE, tem 31 anos. Iniciou no Rádio aos 17 anos de idade.

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