Os louros da ignorância

Coluna Semanal!

Lembro de certa vez que participei de um grupo musical que tinha mais que 50 integrantes. Os melhores cantores que eu conhecia, juntamente com um grupo de leigos que aumentavam o coro em presença e volume de vozes. Semanalmente nos encontrávamos, ensaiávamos cerca de 2 horas e após esse período, o pessoal se confraternizava, saindo pra comer em alguma lanchonete.

Até então, não sabia muito de notas e arranjos musicais, tudo parecia muito fácil, era só aprender a letra e repetir a sequência o que passavam no piano. Como sempre tinha muita gente, era só colar em quem sabia e fingir que entendia.

Só que após quatro ou cinco ensaios, descobri que tinha um ensaio de verdade. Além das letras e notas, haviam dinâmicas, expressões, silêncios, que sempre existiram, mas por ignorância, nunca tinha atentado para esses detalhes. Pra completar, ainda tinham detalhes de roupa, calçados, que não fazia ideia que seriam necessários.

Logo após a primeira apresentação, só se ouviam elogios ao Coral, muito bem ensaiado, regido pela maior referência de música da minha igreja, pelo melhor pianista disponível, tudo lindo, até o primeiro ensaio pós-apresentação. Resumindo o sermão do maestro: Coro disperso, sem dinâmica, fora do tempo, mais preocupado em acenar e sorrir, do que realmente cantar.

O tempo passa, e junto com o aprendizado, vem a experiência. E olhando pra trás, realmente, poderia ser feito muito mais do que realmente se entregou. E nessa transição da euforia de participar para maturidade de como cantar, percebi que muitas pessoas continuavam elogiando, mesmo nos momentos mais sofríveis.

Claro que houveram momentos memoráveis, mas o grande aprendizado é que a ignorância é uma dádiva. E quando você não entende, tudo é lindo. Por outro lado, existe uma lacuna entre potencial e capacidade. Enquanto nos esforçamos para transformar esse potencial em capacidade, teremos os apoiadores, como uma mãe que vai achar tudo lindo, ou uma sogra que até elogia a música, mas lamenta a falta de ensaio e harmonia. Se ensaiar, pode ficar bom...

Conta-se a história que alguém perguntou a Michelangelo, porque ele se preocupava com os cílios dos anjos na Capela Sistina, já que ninguém iria notar esses detalhes quando olhasse para o teto? Sua resposta foi: Eu saberei...

Para quem passa pelo processo, muitas vezes acha que aqueles que cobram, exigem, reclamam, estão querendo implicar, mas a verdade é que eles acreditam que você pode mais do que está entregando até então.

Vivemos em tempos que o sucesso é medido pela quantidade de bajuladores que nos cercam, afirmando que tudo o que fazemos é o máximo, minimizando o impacto das más escolhas, invés de termos do lado, aqueles que sabem onde podemos chegar e nos orientam sobre quais decisões tomar.

Vender sucesso é fácil, é só continuar postando no Instagram. Enquanto uns curtem e comentam, outros compartilham e falam no direct, o que realmente pensam. Aplaudir ou vaiar é fácil, é só curtir ou cancelar.

Os louros da ignorância estão disponíveis para todos, seja por desconhecimento ou por falta de comprometimento. Só que por trás disso tudo, você precisa decidir qual será a sua atitude, aprender e entender que crescer dói, mas liberta, ou se anestesiar enquanto caça likes e apaga os comentários negativos da postagem. A escolha é sempre sua.

Author
Professor Tiago Machado

Tiago Silveira Machado, Eng. de Produção Mecânica, com Mestrado em Eng. de Produção e cursando doutorado em Ecologia Humana e Gestão Socioambiental. Trabalhando como Professor da Universidade de Pernambuco - Campus Salgueiro.

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